Notícia recente informa que uma adolescente de 17 anos matou outra jovem de mesma idade em Itapecerica da Serra, na Grande São Paulo, confessando ter enviado um bolo com arsênico por “ciúmes e inveja”. O agravante no caso é que esta mesma jovem já havia tentado matar outra amiga pelo mesmo método, e, presumivelmente, pelo mesmo motivo.
São Tomás de Aquino, filósofo da ordem dos Dominicanos, por volta de 1250, em uma vida dedicada ao estudo e ensino de Filosofia e Teologia, escreveu que para aquele que inveja, o bem alheio é considerado um mal próprio. Para aquele que inveja, a possibilidade de que qualquer outro esteja acima dele ou seja mais feliz, mais irado ou amado, causa aversão. Depressão, complexo de inferioridade, revoltas profundas provocam raiva e ódio, desejo de provocar o mal.
A inveja pode também assumir disfarces, escondendo-se em sorrisos afetuosos e palavras amáveis, que simulam estima e proteção, mas sempre será um ódio que entristece uma pessoa ao perceber a felicidade alheia; e se o invejado possui algo interessante, o impulso será de tomá-lo ou estragá-lo. O aspecto destrutivo está sempre presente na inveja, e os processos de crescimento do ódio e da capacidade de destruir impedem a utilização deste sentimento em benefício próprio, pois é sempre contrário a uma adaptação situacional, já que esta agressividade, de forma consciente ou inconsciente estará voltada contra si próprio em função de falhas, lacunas, ou defeitos considerados ináveis na comparação com o outro, sempre melhor ou mais privilegiado pela fortuna.
Então o invejoso se vê como deficiente dessas qualidades, imprestável e, portanto, se auto despreza, ou seja, sente tristeza diante do bem do outro. Ao contrário das tristezas comuns, causadas por alguns males, como desastres, fracassos, doenças, mortes, esta é causada por algum bem, um bem que não se possui. E, infelizmente, praticamente quase todos os bens alheios podem ser motivo de tristeza: pessoas vencedoras, bonitas, alegres, simpáticas, inteligentes podem, principalmente na adolescência, provocar invejas.
O que os outros têm: beleza, dinheiro, prestígio, casas, carros, viagens, diversões, instalam o ciúme, que pode levar ao adoecimento e fatalmente levam à inveja; o compositor e cantor Arnaldo Antunes, em sua música Invejoso, descreve um personagem invejando o salário do colega de trabalho, a secretária do patrão, o restaurante onde os outros almoçam, o desgosto e frustração daquele para quem ‘sua fruta só lhe dá caroço’, ou seja, que jamais consegue o que almeja.
Aqueles que trabalham com crianças e jovens sabem que existe um ciúme normal, manifesto no desejo de melhor, se ser mais inteligente, animado e amigo, de destacar-se no grupo; entretanto, o ciúme patológico é também uma realidade, e tanto pais, tutores ou professores nem sempre estão preparados para esta diferenciação.
Porém algumas atitudes dos mais velhos podem auxiliar um jovem em formação, desenvolvendo habilidades e fortalecendo autoestima, orientando para a construção de relacionamentos mais saudáveis. Isso depende de desenvolver o hábito de conversar bastante, em comunicação não agressiva e aberta, para que um grau de confiança possa se estabelecer, e o jovem saiba que pode contar com a compreensão mesmo em seus sentimentos mais complexos e obscuros.
Isso não tem sido simples em tempos de redes sociais, embora o jovem se exponha muito nelas, pouco tem sido conversado em casa ou na escola. A presença constante das telas, a busca eterna dos likes, a incapacidade de distinguir a convivência virtual da real, o pouco contato com pais – que normalmente trabalham o dia todo e chegam em casa exaustos e sem muita vontade de dialogar – cria solidão e apreciação da vida alheia, sempre aparentemente mais feliz e realizada.
É também indispensável que este tutor ou responsável possa discernir quando o ciúme for excessivo ou estiver prejudicando a qualidade de vida, procurando ajuda profissional para controlar a situação, pois nem todos dominam algumas regras básicas para isso.
Trancados em seus quartos, em horas e horas de redes sociais, nossos jovens por vezes são vítimas, por vezes algozes de situações muito perigosas.
Wanda Camargo – educadora e assessora da presidência do Complexo de Ensino Superior do Brasil – UniBrasil.