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Apesar da boa quantidade de áreas verdes, Curitiba não está imune aos efeitos da poluição e das variações climáticas (foto: Franklin de Freitas)

Um estudo realizado na Universidade Federal do Paraná está investigando como a poluição do ar e as variações extremas de temperatura impactam diretamente a saúde pública em Curitiba. A pesquisa, coordenada por um grupo multidisciplinar do Departamento de Engenharia Ambiental, já aponta correlações preocupantes entre a alta concentração de poluentes e o aumento das internações hospitalares, que podem impactar a saúde da população com até um mês de atraso.  4s1u4d

A investigação se concentra em dois fatores principais: o clima e a poluição atmosférica. Os efeitos das ondas de calor sobre a saúde – como insolação, desidratação e cansaço excessivo – são mais facilmente observáveis. Já a poluição, especialmente o material particulado fino, conhecido como poeira, é mais sutil, mas extremamente nociva. Esse tipo de poluente, foco principal do estudo, possui diâmetro menor ou igual a 2,5 micrômetros, cerca de 16 vezes menor que o diâmetro de um fio de cabelo. 

“Elas são invisíveis a olho nu e, por serem tão finas, conseguem penetrar até os alvéolos pulmonares e atingir os brônquios. Algumas dessas partículas chegam até a se dissolver na corrente sanguínea, o que faz com que seus efeitos não se limitem ao sistema respiratório, podendo impactar também outros sistemas do corpo”, explica o pesquisador e engenheiro ambiental Felipe Baglioli. 

Um exemplo do impacto da poluição na saúde foi observado durante um período de queimadas, quando os níveis de poluentes aumentaram em mais de 50% em relação ao padrão normalmente registrado em Curitiba. Após esse evento, foram identificadas entre 10 e 20 internações diárias acima do esperado. Esses dados ainda são indicativos, não representam uma conclusão estatística, mas já apontam para um potencial relação entre a qualidade do ar e a saúde da população. 

Curitiba está mais quente, e isso importa  1i4l1q

De acordo com a série histórica analisada, as temperaturas médias diárias em Curitiba vêm subindo de forma consistente desde 1961. A média aumentou de 16,78 °C (1961–1985) para 18,20 °C (2007–2024), uma elevação de 1,42 °C.  Mais alarmante ainda é o aumento nas temperaturas máximas diárias, que já chega a quase 4 °C no mesmo intervalo. 

Período Temperatura Média (°C) Tendência 
1961–2024 17,41 Aumento 
1961–1985 16,78 Aumento 
1986–2006 17,45 Aumento 
2007–2024 18,20 Aumento 

Esse aquecimento tem impacto direto na saúde da população, afetando principalmente os grupos mais vulneráveis, como idosos e crianças, que sentem as consequências com maior intensidade. 

Inverno e a poluição 4550j

Embora o inverno seja comumente associado a dias claros e sem nuvens, esse é, na verdade, o período de maior concentração de poluentes na atmosfera curitibana. Isso se deve à redução do volume da camada de ar sobre a cidade e à menor circulação atmosférica. 

“Não é porque a gente não está vendo a poluição que ela não está lá”, afirma o pesquisador. 

Outro ponto importante do estudo é que os efeitos da exposição à poluição nem sempre são imediatos. Pesquisas anteriores e análises iniciais deste trabalho indicam que os impactos podem surgir de dois a sete dias após os picos de poluição ou temperatura — um fenômeno conhecido como lag. Para investigar melhor esse intervalo, a equipe está trabalhando com dados diários e pretende utilizar redes neurais para identificar com mais precisão os momentos de maior risco. 

Da pesquisa à prevenção  1q5f6k

O grupo estuda formas de transformar esse conhecimento em medidas práticas, como alertas preventivos à população, em parceria com a Defesa Civil. O objetivo é avisar sobre possíveis aumentos de poluição ou temperatura com base em previsões ambientais, permitindo que a população se previna antes que precise recorrer ao sistema de saúde. 

Atualmente, o estudo conta com sete pesquisadores e conta com a colaboração de meteorologistas e instituições como a Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR). A equipe planeja expandir a pesquisa para cidades da Região Metropolitana de Curitiba, como Colombo e Almirante Tamandaré, que apresentam níveis de poluição frequentemente superiores aos da capital, devido à atividade industrial. 

Embora ainda esteja em fase de tratamento dos dados e sem conclusões estatísticas definitivas, a pesquisa já apresenta evidências significativas sobre os impactos ambientais na saúde coletiva. A equipe pretende finalizar um artigo científico nos próximos dois meses e acredita que Curitiba pode se tornar referência nacional e internacional nesse tipo de análise interdisciplinar. 

“Por mais que Curitiba seja conhecida como cidade verde, estamos longe de estar imunes aos efeitos da poluição e das mudanças climáticas. Precisamos olhar para isso com urgência”, reforça Baglioli. 

Alana Morzelli, sob supervisão de Mario Akira